Uma outra providência

JANIO DE FREITAS

"Não foi o revólver que atirou em Realengo, foi a cabeça do atirador. Para casos de transtorno mental, falta o conhecimento de serviços capazes do auxílio."


A MISTURA DE emoções penosas e cobranças e promessas de pretensas medidas preventivas é um hábito brasileiro, ainda que não só nosso. A combinação é péssima, com a pressa ocupando o lugar da calma indispensável para a ponderação dos problemas e das sempre variadas propostas para prevenir repetições do fato perverso.

Ainda nos desdobramentos imediatos da tragédia de Realengo estavam já propostas e promessas de ações entre pessoas emocionadas e representantes governamentais. Polícia na porta das escolas; fortalecimento e sistemas escolares de vigilância contra violência, ampliação prática das restrições à posse de armas são as majoritárias, muitas vezes igualado seu teor simplório ao pedantismo do "especialista" que também as propunha.

Um policial na porta da escola seria, como disse o secretário José Mariano Beltrame, o primeiro a morrer em Realengo. Esse gênero de proteção tem sido inócuo onde quer que adotado.

Que o digam os bancos, os restaurantes paulistas com vigilante e os shoppings em todas as cidades. Fazer das escolas fortalezas seria absurdo em muitos sentidos, além da evidência de que mesmo quartéis são assaltados, inclusive em seus bancos internos como o da Vila Militar no Rio. E por aí vai.

Os projetos na Câmara e no Senado para ampliação do porte de armas, citados pela aritmética jornalística desde 11 até 300 e tantos na fila, não têm cabimento algum. Muito ao contrário, os portes admitidos por lei devem ser mais reduzidos. O que justifica, entre outros, o porte de arma por bombeiros? Mesmo o porte de armas livre para militares deveria ser objeto de exame (se isso fosse possível no Brasil), com os exemplos do seu mau uso, até a pretexto do trânsito, e a carência de exemplos positivos.

Mas, quanto a episódios de monstruosidade e seus revólveres: se um homicida como o de Realengo, em vez do revólver, matar com faca, alcançará igualmente o seu objetivo.

Não foi o revólver que atirou em Realengo. Não foram os dedos que o acionaram. Foi a cabeça do atirador. Nessas violências, antes de tudo está a cabeça. E por que ela agiu, no caso e nos demais de desatino semelhante? Por desconhecimento e inércia -o que não quer dizer culpa- de segundos e terceiros mais próximos, ou menos distantes, do rapaz arredio.

As poucas e breves narrativas que o retratam, na visão de parentes, expõem com toda a clareza um longo caso de transtorno mental necessitado de tratamento. As narrativas demonstram, na mesma medida, que não faltou a percepção desse estado por quem ouvia ou observava o rapaz: o fascínio pelo ataque às torres em Nova York, o desejo de destruir o Cristo Redentor, a reclusão voluntária, a alteração da própria figura -tudo muito indicativo e bem percebido.

Apesar disso, não houve iniciativa alguma. Apenas estranheza. Não há por que imaginar descaso, muito menos de todos. A falta, tudo indica, foi de conhecimento do que fazer. De conhecimento da existência de serviços capazes do auxílio, até em um simples posto de saúde apto a dar orientação sobre o serviço a procurar. Sim, tais serviços são pouco numerosos; faltam-lhes mais verbas, mais pessoal, mais instalações. Existem, no entanto. E devem ser procurados para casos como o do rapaz de Realengo. Tão numerosos.

A providência que falta é a informação ao grande público sobre o que está ao seu alcance, quando estranhezas excessivas e injustificáveis impressionem. Não porque a persistência das condutas leve a desfechos horríveis. Mas o sofrimento do próprio transtornado já é bastante para uma iniciativa solidária.
Providência governamental já atrasada é uma campanha insistente de esclarecimento do grande público, sobre o que deve fazer diante de casos como o do rapaz de Realengo antes da explosão de seu distúrbio. Isso, sim, é uma das prevenções necessárias - para pacientes e para a sociedade.

Do contrário, nos casos que vão aos extremos, quando não forem revólveres, serão facas, serão barras de ferro, serão as mãos. E, nos outros casos, será o sofrimento reparável de tanta gente, dos pacientes às famílias e aos próximos.

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po1004201105.htm

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#Entrevistando Psicólogos - 2ª entrevista

Nome: Jucely Giacomelli 
Formada em: 1976


1. Quando começamos o curso, todos perguntam por que escolhemos Psicologia. Hoje, afinal, você consegue responder esta pergunta? Em que outras carreiras pensou?
 A minha primeira escolha sempre foi Psicologia. Durante um periodo estive voltada para uma outra carreira que também demanda formação continuada, paciência, comprometimento, disciplina, dedicação, muito amor... ser mãe. Ou seja, o que considero essencial na carreira, seja ela qual for é estes requisitos que enumerei, aliados a gostar muito do que escolher, só assim as dificuldades que os começos demandam são superados com maior tranquilidade.
  
2. Como foi entrar no mercado de trabalho? 
Entrar no mercado de trabalho não é uma tarefa fácil, mas com insistência é possivel alcançar o que desejamos. Fui em busca do que fazia sentido e pessoalmente levei curriculum, ofereci estágio, trabalhei horas sem remuneração, até que foi se consolidando um ambiente de confiança. A carreira voltada para a saúde necessita que possamos estar disponíveis e consigamos de fato passar esta idéia para colegas que possam nos estimular e ajudar no percurso. A circulação entre colegas da mesma área é de suma importância No meu ponto de vista, a análise pessoal, a participação em grupos de estudos, as supervisões de colegas com maior tempo de formação são de importância também na formação profissional.
  
3. Em qual ou quais áreas atua hoje?
Atuo no atendimento de adultos e adolescentes em clínica particular e sou prestadora de serviços em instituição psiquiátrica, para atendimentos emergenciais.
  
4. Teve alguma experiência profissional ruim em que pensou: "isso não é para mim"? Se puder conte também alguma experiência em que se sentiu realizado.
Experiências muitas, mas não as considero boas ou ruins e sim formadoras.
  
5. Uma palavra, uma frase ou mensagem aos estudantes de Psicologia. Qual a sua?
Aos estudantes de psicologia eu diria, experimentem daquilo que vão oferecer um dia: terapia!